Ps. Diário do garoto Johan encontrado
por estudantes de geologia no devastado bosque do PARALELA’S GARDEN
“Os olhos viram e as mãos amassaram o bilhete de despedida,
jogada abruptamente ao cesto de lixo na tentativa vã e desesperada de enterrar
para sempre o tortuoso crime ou quem sabe escamotear um sentimento destinado ao
fim desde a sua gestação. Um papel que tinha o cheiro da dor e da despedida. Ah..
quão longas foram aquelas frases de ADEUS daquela que me dera o meu primeiro
beijo aqui do alto dos meus dezessete mal vividos. Longas e especiais foram
nossas escapadelas rumo ao Bosque Paralela Garden. Foi lá que já perdidos,
tentamos nos achar e quase nos perdemos de vez. Entregamos-nos num labirinto de
árvores e flores que demoradamente íamos buscando cultivar em cada área vazia,
sem cor e sem vida. Não havia placas, nem regras. Quando entramos ali,
estávamos decididos a andar para frente, sem olhar para trás, a fim de ficarmos
longe da dor. Conseguimos? NÃO. – TALVEZ por algum tempo. Sabia que não havia
saída dali, e eu nem queria que houvesse. Equivoquei-me a pensar que estaríamos
destinados a nunca mais deixar aquele exótico Bosque Paralela. Mas você se foi, companheira, e deixou para
trás os jasmins, as roseiras e as folhas de chá que esquentavam a alma em dias
de frio. Em letras miúdas as frases foram mutilando o sonho e a fantasia, me
resgatando a contragosto para o mundo real. Só doeu porque sabíamos nós que a
vida real, diria Abujamra, é uma espécie de “causa perdida”, sem graça e sem
poesia. Mas não ali, querida. Não em nosso Bosque, onde até os anjos lavariam
os pés antes de violá-lo.
- Diga-me vós, enigmática lua, quantos primeiros beijos um adolescente
português sentimental pode dar e receber ao longo da vida, sem que haja maiores
desdobramentos sentimentais? Não sei... poucos?!!
- Por que foste embora querida, se nossos beijos ali se
multiplicam na medida do desejo e da loucura? INTERMINÁVEIS!
Com a Lohana todo beijo é (fora) o primeiro. Oh, pobre e traiçoeiro coração que não
entende as necessidades do corpo, quando ao contrário busca conquistar aquilo
que nunca esteve lá para ser conquistado, procurando o sublime na calada da
noite, sem barulhos ou estardalhaços. Envolve-nos no mistério e nos deixa
reféns do acaso. Agora eu sei! Sei que os Bosques não são encantados, os amores
quem os são.
- Como pode o lápis e o papel se deixarem usar para o
doloroso ADEUS, uma vez que já foram testemunhas dos amores mais sublimes e
mais deliciosamente sacanas?
“Querido Johan,
Queria lhe dizer isso
que vou dizer agora pessoalmente, mas acho que não tenho coragem... me deixar
envolver por você foi uma das melhore coisas que me aconteceu nos últimos
tempos. Me senti linda, querida, desejada... mas não posso continuar... não me force a lhe dar explicações.. você
jamais entenderia.
ADEUS!
Nunca me esquecerei das cavalgadas nas tardes
de terça, nos labirintos infinitos do nosso Bosque Paralela Garden.
ADEUS, JO
Ass. EU”
As lágrimas que rolaram na face não foram mais volumosas do
que aquelas enfiadas goela abaixo naquela tarde de quinta. ELAS NÃO FAZIAM
PARTE DO ACORDO. Cada palavra sangrada naquele bilhete ficará guardada,
solitária, no baú do esquecimento. Vou levar comigo apenas o sorriso fácil e
bobo daquelas tardes chuvosas de maio, o cheiro das flores do Bosque, nossos
abraços, as conversas proibidas e o carinho que engrandeceu o homem por detrás do menino. Para
finalizar, guardarei um pouco de dor para me lembrar de respeitar as promessas
feitas, a decisão tomada, o caminho seguido.
Um beijo carinhoso, my honey,
do seu, pra sempre seu...
JOHAN”
“And I'd give up forever to touch you”
Goo Goo Dolls
P.S. Há informações de que o diário
foi encontrado pela metade. Suspeita-se que parte significativa do seu conteúdo
tenha sido levado e que o jovem Johan não escrevia sozinho. Será? Uma
editora pouco conhecida no Nordeste de Portugal acredita que encontrará as
páginas que faltam para publicações posteriores. Muitas lacunas ficaram. Não se sabe de onde vieram e de que forma se iniciou a relação do romântico Johan e sua enigmática Lohana. Não se sabe se o tal Bosque Paralela Garden é real ou fruto de um delírio criativo.Quem é Lohana? Qual a origem dos seus conflitos? Quem é Johan? Por que seu diário teve suas páginas arrancadas? O que querem esconder? Perguntas que talvez estejam sepultadas para sempre no imaginário das crianças que brincaram no místico Bosque Paralela.
Atenciosamente
A.M.